21.1.05

Memória de elefante? -

Nossa memória é um mecanismo impressionante. Cada momento vivido fica armazenado para sempre em nosso subconsciente. Entretanto, não nos lembramos de todos. Só alguns marcam, só alguns continuam fazendo parte do arsenal de informações que formam os nossos pensamentos diários.

Uma explicação para isso pode ser a intensidade de sentimento que cada momento provoca. Palavras, imagens, gestos, podem tocar nossos corações de um jeito mais profundo e se eternizar em nossas mentes - como o primeiro beijo, o primeiro rompimento, aquele brinquedo especial, a prova que "inexplicavelmente" recebeu nota 10. Mas, às vezes, coisas banais, detalhes até insignificantes, também deixam marcas profundas. Há quem, aos 95 anos de idade, saiba dizer o tipo de prataria usada em cada um dos jantares oferecidos durante toda a vida. Acredite!

Já outros momentos parecem se apagar. Não que eles não existam guardados em algum lugar, mas eles não ficam acessíveis. A regressão é uma terapia que utiliza o relaxamento profundo e a indução como forma de trazer à tona essas lembranças. Especialistas dizem que esse processo ajuda a tirar os bloqueios adquiridos e a aprender a lidar com situações traumáticas, já que, em grande parte, os fatos esquecidos são aqueles que provocaram sentimentos negativos. Casos de pessoas que sofreram violência sexual são uma prova disso. Algumas lembram diariamente do ocorrido, mas muitas esquecem ou distorcem os fatos, numa defesa natural para diminuir o sofrimento. Nós funcionamos assim. Selecionamos, consciente ou inconscientemente, o que queremos, ou não, lembrar. Atribuímos importância, adjetivos e vida própria a cada acontecimento que passamos.

Se compararmos nossas lembranças de um momento da infância com as de um irmão ou de um amigo, elas serão diferentes. Einstein provou com a Teoria da Relatividade que dois momentos podem ser lembrados em ordens inversas por duas pessoas que o vivenciaram juntos. Por exemplo: para um, determinada festa ocorreu antes daquele jogão do Brasil; o outro vai jurar que a festa foi dias depois do jogo. Nossa memória não obedece aos padrões lineares de tempo que Newton definiu no fim do século XVII e início do XVIII. Já em 1905, a Teoria da Relatividade explicava que o espaço não é tridimensional e o tempo não é absoluto. Eles formam um contínuo tetradimensional, o "espaço-tempo". Basta ver que nós vivenciamos o tempo de forma relativa: os momentos agradáveis parecem passar voando, já os tristes parecem durar uma eternidade. Nossa memória funciona dessa forma, armazenando tudo o que acontece conosco como eventos individuais, com sua própria definição de espaço-tempo. A aparente linearidade depende do observador. Assim como a importância de cada fato também.

Saindo da teoria e concluindo, podemos dizer que nossas lembranças definem quem somos. Os amigos que conquistamos, aquilo que aprendemos, o que fizemos, o amor que demos, formam o nosso eu. E é aquilo que está vivo na memória que nos ajuda nessa auto-definição. Aos 80 anos de idade, somos o que podemos contar. Aos 80 anos de idade, somos o que construímos. Não há mais o que fazer, história por criar, sonhos por concretizar. Nossa memória é tudo o que temos.

Talvez por isso devamos pensar bem em cada um dos nossos atos e, se preciso, contar até 100 antes de tomar determinadas atitudes. Parafraseando o conhecido ditado, "digas do que lembras, que eu te direi quem és".

Bibliografia: BRENNAN, Bárbara Ann. Mãos de Luz. São Paulo: Ed. Pensamento, 1987.

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